21 setembro 2013

e de repente é noite (XIV)


XIV
Deixai a criança sentada no granizo
de um sono iluminado de distância.
Já se soube dela seu horto de escombros
em que disfarça contornos de um centro vegetal
e uma chuva primeira de obscuro saber.
Nem sua mãe a acordou para mais justas medidas:
geométricos movimentos resumidos
a voos de vidro nas janelas
reproduzidas pelas nortadas
até à saturação dos cerros.
Talvez só ela suspeite
que amar é suspender a marcha e ficar a ver
as lentas oscilações dos teixos
concentrando todo o ardor da criança
na euforia de um gesto que descobre
vértebras de tristeza no corpo da alegria.

Poema de João de Sá, do livro "E de repente é noite", 2008.
Fotografia: souto em Benlhevai

1 comentário:

Transmontana disse...

Além do poema, que é lindíssimo, a foto deslumbrou-me!
Parabéns!